“Releio no momento um livro que marcou meu período de formação, muitos anos antes de me tornar um profissional do campo da literatura e da crítica. Trata-se de Llano en llamas, livro de contos publicado pela primeira vez em 1953, do excepcional escritor mexicano Juan Rulfo. Chão em chamas, como foi traduzido ao português, apesar de menos conhecido do que Pedro Páramo – romance de Rulfo recentemente adaptado pela Netflix –, também influenciou profundamente no realismo mágico e no chamado ‘boom’ da literatura latino-americana. Nesta segunda leitura, desta vez no original em castelhano, pareceu-me ainda mais convincente o artifício da emulação da linguagem oral e popular de forma ao mesmo tempo natural e simbolicamente enriquecedora. Do ponto de vista formal, o livro desafia o leitor com o uso muito preciso e bem realizado da fragmentação temporal e narrativa, do monólogo interior e de narradores nos quais o leitor não pode confiar completamente, sendo levado a reconstruir suas percepções de leitura ao final de cada conto. Destaco, em particular, o texto que mais me impressiona entre os 17 presentes no livro: ‘La herencia de Matilde Arcángel’, uma narrativa extraordinária em sua capacidade de concisão, apreensão sensível da tragédia humana e engenho criativo na construção do enredo.”
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Chão em chamas, de Juan Rulfo
José Olympio
208 páginas
Eduardo Cesar Maia é crítico cultural e professor de Comunicação e Literatura na UFPE.