O 10º Prêmio Hermilo Borba Filho de Literatura, promovido pelo Governo de Pernambuco através da Secult-PE e Fundarpe, em parceria com a Cepe, anunciou os vencedores de 2024. As obras premiadas são “Ele costura com a pele uma casa para os mortos” (Marcondes FH), que recebeu R$ 36 mil e será publicada em 1.000 exemplares, além de “Almas, sóis e viadutos caindo” (Carla Montanha), “Teares de sombras, de fogo e de luz” (Virgílio Siqueira), e “Mói o mundo a usina” (Luiz Henrique Costa de Santana), cada uma premiada com R$ 18 mil e publicação de 800 cópias pela Cepe Editora.
O prêmio tem suas categorias divididas não por estilo ou gênero, mas, para incentivar a produção em todo o estado, por zona geográfica. Com 154 inscrições de várias regiões do estado, sendo 75 da Região Metropolitana do Recife, 31 do Agreste, 18 da Zona da Mata e 15 do Sertão.
Marcondes FH
Natural de Barreiros, PE, Marcondes FH foi o primeiro colocado na premiação, com o livro de poemas “Ele costura com a pele uma casa para os mortos”.
“A ideia do livro é resgatar a história dos subalternos neste nordeste-ruína. Os poemas exploram temas como o colonialismo, HIV e negritude de uma forma fluida e simples, como se cada poema contasse uma história. A ideia era construir uma casa para abrigar esses personagens inquietos e silenciados, para que eles tomem conta das suas narrativas como se estivesse sendo a primeira pessoa e não tendo como interlocutor um intelectual branco. A emoção de ganhar um prêmio é indescritível, ser reconhecido e respeitado enquanto um escritor e artista em Pernambuco. E, para mim, a maior importância que esse prêmio tem é o de representatividade, já que sou um autor negro e homossexual. Então, como forma de resistência e como forma de me afirmar como uma pessoa que luta pelos direitos das pessoas negras e das pessoas que vivem com HIV, é de suma importância ter um documento que afirme essas narrativas.”
Carla Montanha
Carla Montanha, de Garanhuns, é uma multiartista do interior pernambucano. Trabalha em produção cultural, literatura, audiovisual, fotografia, teatro e é formada em Pedagogia pela UFAPE (Universidade Federal do Agreste de Pernambuco). Atualmente se dedica fortemente à literatura, tanto em versos livres, como na poesia popular; do Cordel às Mesas de Glosa. Ganhou o prêmio destinado ao Agreste, com a obra “Almas, sóis e viadutos caindo”, um livro que a autora conta ter começado a escrever (e reescrever) onze anos atrás, quando sua idade era de 16 anos.
“Acho que ainda não tô acreditando. Não caiu a ficha. Sou a primeira mulher do Agreste a ganhar, junto de mim várias mulheres vem junto, as que me criaram, as que me incentivaram, as que me inspiraram. O sentimento que sinto é que eu estou me tornando a escritora que sempre sonhei. Se eu pudesse falar de emoção neste momento: diria que é um abraço, imagine quantas pedras essa poetisa já passou. Depois de cortar muito os pés e me livrar delas, sinto esse prêmio: um abraço. A importância do prêmio na minha carreira é gigante. Eu que tantas vezes luto, reivindico, milito, vou atrás, corro, sangro e dou tudo de mim. No dia que ganhei, meu amigo Felipe Espíndola, ator e pessoa que me acompanha na luta, disse: ‘parabéns por esse prêmio, você luta pela sua literatura’. Isso ficou no meu coração, eu sempre tô suando por espaço, por levar a literatura aos lugares, e o reconhecimento? Que reconhecimento? Eu não sei nem direito o que é isso. E talvez eu nem precise disso. Tantas vezes vou nas escolas de graça, quem me reconhece são as diretoras, as professoras. Mas reconhecimento? É algo difícil e que talvez eu nem queira. Eu só quero continuar mostrando como a minha vida foi mudada pela literatura, e mudar as de outras crianças e jovens. Mas, depois desse prêmio, muita coisa muda, parece até que viver também de literatura é ser gente (risos). Agora as pessoas vêm parabenizar, tem um prestígio social bonito, mas enquanto eu tava lá com minha sacolinha, vendendo cordel no meio da rua, às vezes as pessoas só ignoravam. Ganhar esse prêmio muda a forma que a gente é olhado, vai me levar pra muito lugar bom, vou poder realizar sonhos, alcançar outras pessoas, que é meu intuito. Ganhar esse prêmio muda a forma que as pessoas enxergam, mas não muda as rotas do que a gente já lidou. Mas é um abraço, é satisfatório enxergar nossa altura, mulher de interior venceu pela sua poesia: e de baixo enxergar algumas coisas continuarem iguais, e talvez a gente não mude, mas isso não é sobre mim, eu só quero voar com a minha poesia.”
Luiz Henrique Costa de Santana
Com apenas 24 anos, o escritor natural de Vitória de Santo Antão ganhou o prêmio destinado à Zona da Mata, com “Mói o mundo a usina”.
“Até agora a ficha ainda não caiu. Porque é uma conquista muito grande para mim. Essa é a terceira vez que eu tento, na primeira vez eu fiquei entre os livros que foram menção honrosa no prêmio; na segunda vez eu tive alguns problemas durante a inscrição, não tive tempo suficiente para organizar todas as documentações necessárias. E nesse ano eu pude refletir mais sobre a minha escrita, sobre as narrativas que me atravessam, e, a partir daí, eu consegui retomar boa parte das questões que eram necessárias para mim. Uma dessas questões é a seguinte: qual o fio narrativo que é construído na família daqueles que trabalham para o açúcar chegar na nossa mesa? Como a família do meu pai reside aqui na Zona da Mata, e, de igual modo, é uma família que ainda trabalha no corte de cana, um trabalho muito manual… Decidi escrever sobre esse mundo, há tanto tempo esquecido pelos olhares dos literatos. O meu livro ‘mói o mundo a usina’, toca nesse lugar sensível. Sobre a importância desse prêmio para minha carreira literária… Eu posso dizer que estou grato. Fico muito feliz do meu livro ter sido escolhido e, agora, né, com 24 anos, eu percebo que ganhar esse prêmio torna-se o pontapé inicial da minha carreira, ter o meu nome sendo ventilado pelos leitores críticos do prêmio Hermilo Borba Filho, que faz essa homenagem ao escritor que é extremamente importante para nossa cultura, é algo ainda inconcebível para mim.”
Virgílio Siqueira
A obra “Teares de sombras, de fogo e de luz” garantiu ao Poeta, compositor e escritor de Ouricuri o prêmio destinado ao Sertão pernambucano.
“Ser agraciado com o prêmio Hermilo Borba Filho é antes de tudo gratificante; mas não é só isso. O prêmio representa, além do reconhecimento, abertura de portas e possibilidades. A CEPE, editora que institui o prêmio, junto à Secretaria de Cultura de Pernambuco, é sinônimo de qualidade editorial; sendo inclusive detentora de prêmios nacionais. Sinto-me reconhecido; engrandecido e definitivamente inserido no contexto da riquíssima poética pernambucana.”